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quinta-feira, 25 de outubro de 2018

O trinco no portão, a violência contra a mulher e nossos direitos


No final dos anos 1980, embaladas pelo ar democrático reinante no país, pelo borbulhar da expressão de liberdade e com recente proclamação da nova Constituição Federativa do Brasil que, finalmente ditava direitos iguais entre mulheres e homens, um grupo de mulheres advindas de movimento estudantil, movimento sindical, partidos políticos e Igrejas se reúnem e começam a realizar palestras e encontros com o tema fim da violência contra a mulher e  a igualdade entre mulheres e homens. As palestras eram realizadas na UEM, nas escolas e grupos de Igrejas.
Uma dessas palestras, realizada em uma escola pública de um bairro da periferia nos marcou profundamente. Falávamos da recém-criada Delegacia da Mulher e que as mulheres deviam procurar ajuda e não se sujeitarem à qualquer tipo de violência. 
 Ao final da palestra, uma senhora com um ar misto de doçura com tristeza pediu pra falar conosco. Ela nos contou sua história, que não tinha estudado, nem trabalhado fora, tinha duas filhas pequenas e o marido a agredia fisicamente. Ela nos contou que sabia se iria apanhar naquela noite pela forma como o marido abria o trinco do portão.
Fomos embora entristecidas pois levantamos o problema mas não tínhamos como encaminhar aquela mulher.  As delegacia da mulher era uma novidade e, mesmo com boa intenção, a infraestrutura de recursos humanos e materiais era insignificante diante da demanda da sociedade.
A primeira Delegacia da Mulher foi criada em 1985 em São Paulo. Dado o alto índice de violência contra a mulher, tornou-se necessário a criação de uma delegacia especial de atendimento à mulher vítima de violência para que a mulher pudesse prestar queixa e ser atendida por mulheres, para se sentir mais acolhida.
Mas, aquela senhora precisa de muito mais do que ir a uma Delegacia da Mulher prestar queixa do marido.  Ela precisava de apoio, de acolhimento e de fortalecimento. Na época, a própria mulher voltava para casa com a intimação para  entregar para o marido. Imagina a situação. A pena imputada para o marido, em alguns casos, era uma cesta básica de multa e um “sermão” antes de voltar para sua casa. O ciclo da violência era claro, o marido agressor se acalmava por um tempo e depois recomeçava  a violência contra  sua mulher.
Naquele dia, a nossa tristeza ficou mais intensa pois não existia acolhimento para as mulheres, apenas a denuncia na Delegacia da Mulher. A Casa Abrigo que teve sua primeira unidade na prefeitura petista em Santo André possibilita que as mulheres em situação de violência possam reestruturar suas vidas.
Em 2006, foi promulgada, pelo então presidente Lula,  a Lei Maria da Penha. Trata-se de uma lei que tira a violência do âmbito doméstico, exige a integração entre polícia, saúde e justiça e tipifica os vários tipos de violência. A Lei, hoje, mesmo ainda com deficiências em sua aplicação, é a Lei mais conhecida dos brasileiros. Constata-se pela estatística que a aplicação da Lei Maria da Penha e das medidas protetivas foi responsável por salvar a vida de mulheres no Brasil. Infelizmente, mulheres ainda sofrem violência e morrem nas mãos de seus companheiros.
Muito mais tarde, no Governo Dilma, que teve um olhar especial para as mulheres, foi promulgada a Lei do Feminídio que pune com mais rigor o assassinato de mulheres motivado pela condição de ser mulher. Outras ações que empoderaram as mulheres foram: o Bolsa Família e o Programa Minha Casa Minha Vida colocados no nome das mulheres, o disque 180, campanhas de mobilização pelo fim da violência contra a mulher, a  promulgação da lei que proíbe salários diferenciados entre mulheres e homens na mesma função, o programa de geração de emprego e renda para mulheres e o fortalecimento das secretarias das mulheres nos municípios.
Para quem vive em situação de violência doméstica, esse conjunto de medidas contribui para que a mulher se sinta fortalecida e possa recomeçar sua vida.
Mais de 30 anos nos separam daquela senhora. A cada palestra que fizemos ao longo desse tempo, nos lembramos dela. A cada década víamos que a vida dela e de muitas outras na mesma situação poderia ter mudado para melhor se a rede de atendimento às mulheres vítimas de violência existisse naquela época.
 O olhar dos governos petistas para a luta e o sofrimento das mulheres fez toda a diferença no momento de estabelecer políticas públicas, com a criação em 2003 da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres e o Pacto nacional pelo enfrentamento a violência contra a mulher. Em todas as Conferências Nacionais de Políticas para Mulheres, tivemos apoio, presença e encaminhamento das propostas vindas dos mais variados cantos do Brasil, das mulheres do campos, da cidade, das florestas, do litoral, das fronteiras, indígenas, negras, portadoras de necessidades especiais, lésbicas, trans, enfim mulheres guerreiras, brasileiras lutadoras.
Agora em 2018, ouço um candidato a presidência dizer que não contrataria mulher grávida, que mulher deve ganhar menos que homem, que só não estupraria uma deputada por que ela não merece, que teve 3 filhos homens e na última deu uma fraquejada e veio mulher e que propôs um projeto para proibir o SUS de atender as mulheres vitimas de violência.
Depois de tudo que conquistamos, a duras penas, temos que continuar  lidando com o machismo. Alguns anos atrás, eu disse em uma palestra que se bobeássemos  iríamos usar a burca que encobre os rosto e os corpos das mulheres. As mulheres riam e achavam que eu estava exagerando. Infelizmente, vejo que não foi exagero.
Depois de toda essa trajetória de conquistas em nossas vidas, não podemos retroceder e colocar na presidência do país, alguém que não respeita as mulheres nem as minorias e ataca nossa democracia e a liberdade de expressão.
Não podemos voltar a sentir aquela imensa tristeza e aquele nó na garganta por não poder atender plenamente aquela senhora e suas filhas pois não possuíamos os instrumentos de apoio que viriam anos depois, por não podermos tirar o "trinco do portão" de sua vida.
Precisamos seguir em frente, fortalecer nossa rede de atendimento às mulheres em situação de violência e empoderar nossas meninas e mulheres.
Precisamos fazer valer a Constituição Brasileira que diz que homens e mulheres são iguais em direitos e deveres, conforme ditado no Art. 5º e seu inciso I“ Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”.
Por tudo isso e sabendo o que os governos petistas fizeram na área de direitos fundamentais, sigo firme com o Professor Haddad 13 pois sei em seu governo teremos valorização das mulheres e o fortalecimento dos programas de apoios às mulheres vítimas de violência.

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